quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Marina Castañeda


          A ausência de medo é um dos fatores que separam os homens das crianças e das mulheres. O que significa, e como se manifesta,essa pretensa valentia?
          Em primeiro lugar, expressa-se com grande freqüência como uma lamentável falta de precaução. De homens que dirigem motocicletas sem usar capacete a motoristas que ultrapassam em curvas sem hesitar e operários que usam ferramentas perigosas ou substâncias tóxicas sem proteção alguma, muitos homens recusam-se a tomar cuidado por medo de parecerem medrosos. Segundo as equações simplistas do machismo, precaução significa medo, e este é uma emoção indigna do homem, uma debilidade própria das mulheres; como conseqüência necessária, ausência de cuidado equivale a valentia. No entanto, não  podemos chamar coragem a essa forma de temeridade, porque a coragem bem compreendida não significa ignorar o perigo, mas enfrentá-lo com inteligência e com maiores possibilidades de vencê-lo. E o custo da temeridade é altíssimo: traduz-se anualmente em dezenas de milhares de acidentes de carro e de trabalho, que poderiam ter sido evitados com um mínimo de precaução. A cultura da prevenção, que as autoridades tanto encorajam quando exortam a população a seguir as medidas de segurança em todos os tipos de situação, continuará a ser pouco eficaz enquanto perdurarem os valores machistas. Muitos homens desobedecem às regras não por ignorância nem por inconsciência, mas por machismo.
         E o que dizer dos homens que, para não parecerem “covardes”, se enredam em discussões ou brigas das quais sabem que sairão machucados? Quantas altercações desnecessárias e insensatas não ocorrem porque um ou vários homens sentem-se obrigados a demonstrar que “não tem medo de ninguém”? Poderíamos dizer que a falsa coragem do machismo (falsa porque não enfrenta o medo, apenas o disfarça) é uma atitude de alto risco, que cria dificuldades e perigos para toda a sociedade. Além disso, a vergonha que alguns homens sentem quando têm medo pode  obscurecer o julgamento e distorcer suas reações: agem a partir do medo da vergonha, em vez de se deixarem guiar pelo medo do problema real.
[...]
      A reticência em mostrar o medo também impede os homens, em muitas ocasiões, de solicitar auxílio. Nas mesmas circunstâncias  em que uma mulher não hesitaria em buscar assistência – nas vias públicas ou em algum lugar desconhecido -, muitos homens recusam-se a demonstrar receio ou insegurança e tentam sair da dificuldade sem recorrer a ninguém. O mesmo acontece, decerto, no terreno das relações interpessoais, que tão freqüentemente exigem a superação de temores profundamente arraigados, como o medo da rejeição ou do abandono. Em vez de compartilhar esses medos (que, afinal, são naturais), muitos homens preferem guardá-los para si, anulando assim a única ajuda real que poderiam encontrar, e que está no diálogo.

CASTAÑEDA, Marina (2006). O machismo invisível. São Paulo: A Girafa Editora.p.138-139



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