Para além da minha opinião sobre
beleza física das mulheres eu não pude deixar de achar graça em todo esse
rebuliço por causa do corpo da Gracyanne. Centenas de homens e mulheres fazendo
comentários sobre tamanha modificação corporal e postando fotos comparando-a ao
Hulk. Pois bem, a graça consiste no fato de ninguém apontar as dezenas de
outras “modificações corporais” as quais as mulheres se sujeitam para estar na
Sapucaí: implante de silicone, implante de bumbum, lipoaspiração, dieta
extrema, malhação pesada, tratamentos dermatológicos, tratamentos estéticos, operações
cirúrgicas leves, médias e/ou pesadas, etc, etc...
Esse tipo de intervenção corporal não é discutida ou rechaçada, pois o seu objetivo é deixar a mulher mais “feminina”. Logo, não importa o nível de sacrifício, dor ou risco para saúde, porque o objetivo é se tornar a mulher perfeita. Ainda que se morra tentando. Contudo, uma mulher buscar um corpo musculoso (ainda que isso não signifique perda de saúde) não pode! Imagina se a moda pega e toda mulher decide ficar forte daquele jeito? Porque a comparação feita foi com o “Hulk” sabe, aquele símbolo de poder e força que pode ser associado positivamente aos homens, mas para as mulheres vira apenas uma ilustrativa chacota. Porque força física e poder é algo que não-nos-pertence. É um afronte social. Além do mais a bunda dela estava estranha, aí mesmo que estamos bem embasados para repudiar seu corpo não-perfeito, a despeito do esforço de horas na academia para atingir aqueles músculos. Pode jogar tudo no lixo Gracy, o esforço não valeu a pena...
Isso imediatamente me lembrou duas pessoas. Uma foi o Iggy Pop em uma frase que ele diz
“Não tenho vergonha de me vestir como uma mulher, porque não acho vergonhoso
ser uma mulher.” Ao meu ver, os homens que comparam a Gracyanne à um homem,
acham vergonhoso ser homem, e ponto.
A segunda pessoa é a Collete Dowling em vários trechos do seu livro “O mito da fragilidade”, os quais são bons para fazer pensar sobre todo esse patrulhamento em relação ao corpo feminino.
Esporte é masculino. Músculo é masculino. Poder é masculino.
E à medida que a mística do poder masculino é lentamente esvaziada, como um
balão furado, os homens acham que algo lhes está sendo tomado. Pensam que algo
está inegavelmente, correndo risco, que alguma
coisa profundamente antinatural está acontecendo, e que estão à mercê de
algum enorme e poderoso mecanismo contaminado pela injustiça – injustiça contra
eles. [pg190]
O mito da fragilidade não se
refere apenas à exclusão da mulher do “mundo do esporte”, à “negação de permissão
para competir” ou mesmo a condição de vítimas de discriminação, mas ao fato de
ela ser realmente impedida de usar o corpo – e isso por uma boa razão. Quando
fisicamente debilitada, ela se torna social e politicamente fraca. Não é tanto
que o homem queira que ela seja frágil e fisicamente inapta e, sem dúvida, há
homens que sequer desejariam isso. O que
eles querem, simplesmente, é continuar a tomar as grandes decisões e isso é mais fácil de conseguir quando o
outro – a outra raça ou o outro sexo – é economicamente enfraquecido,
intelectualmente debilitado, fisicamente rebaixado ou, idealmente, todas as
três coisas.
No último século, graças a uma intensa luta, a mulher conseguiu
livrar-se dos dois primeiros estados de fraqueza. Agora, está conseguindo
libertar-se do terceiro. O homem, na verdade, está muito preocupado vendo-a
abandonar o estado anterior de debilidade e obter poder físico, que é o poder
final de que ela necessita – o poder que selará igualdade. Por essa razão, a sociedade fez, e faz, um grande esforço para
controlar o desenvolvimento físico de menina e mulheres e mantê-las fora do jogo – um jogo que é muito mais
importante do que apenas o jogo do esporte. [Pg198]
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